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25/10/2018

María Emilia López fala da dimensão política da cultura da infância

A educadora argentina María Emilia López abordou a dimensão política da cultura infantil em palestra promovida pela CE CEDAC e realizada na Unidade Morumbi da Escola da Vila. Especialista em educação inicial, María Emilia defendeu a grande importância das instituições públicas que possam ajudar pais e mães na educação de bebês e crianças.

María Emília, que dirige a creche da Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires há mais de 20 anos e lá recebe bebês a partir de 45 dias de vida, relata que acompanhar o seu desenvolvimento e estabelecer uma relação com as suas famílias desde tão cedo permite a ela e à sua equipe fazerem intervenções (ações com potencial de produzir efeitos positivos) que contemplam não só as questões pedagógicas, mas também psíquicas dos bebês.

A educadora lembrou a plateia – composta por educadores da CE CEDAC e instituições parceiras – da enorme fragilidade dos bebês e da necessidade de sustentação psíquica que precisa ser criada pelos adultos que acompanham o seu desenvolvimento, e fez ponderações sobre o desafio praticamente impossível de uma mãe, ou mesmo um casal, assumir isso sozinha.

“Quando uma criança chora por uma angústia ou uma raiva que não consegue resolver sozinha, ela pode despertar nos adultos sentimentos selvagens. Se esse adulto está sozinho, é mais provável que libere o seu monstro, que descarregue de alguma forma sobre a criança – seja com violência física ou até mesmo com a indiferença. Todas essas reações, que são defesas, isolam a criança.” Vale mencionar brevemente aqui um dos conceitos trabalhados por María Emilia: “o lugar das coisas selvagens”, definido como todas as nossas experiências da infância que não foram suficientemente cuidadas, processadas. Tal conceito foi desenvolvido pela psicanalista Joan Raphael Leff, com base no livro Onde vivem os monstros, de Maurice Sendak.

Por isso a educadora avalia que instituições de educação infantis são extremamente necessárias na atualidade, mesmo em situações em que pais e mães reúnem as condições objetivas para ficar com seus filhos, já que a capacidade de “maternar” hoje envolve demandas muito complexas. Usando o conceito de Winnicot de que o bebê precisa de uma mãe suficientemente boa, María Emilia questionou: “O que é uma mãe suficientemente boa, em um mundo suficientemente ruim?”.  A creche dirigida por María Emilia tem como destinatários tanto a criança como seus pais e mantém um espaço cotidiano, com livros e propostas de jogos e brincadeiras para que possam estar com os seus filhos. Isso permite aos familiares e seus bebês uma experiência de transição coletiva, que os protege de uma possível solidão e da fragilização ocasionada por mudanças abruptas na vida dos bebês.

A educadora ressaltou a importância da disponibilidade do adulto para possibilitar interações que protejam os bebês do isolamento. Ela sustenta que  é preciso se abster de privilegiar algo na sua observação, para estar totalmente aberto à individualidade da criança.

Segundo María Emilia, é fundamental diferenciar o posicionamento de quem pergunta e de quem impõe algo. Quando nos colocamos no lugar da pergunta, nos colocamos de forma horizontal, praticamos o princípio da igualdade. E igualdade implica no reconhecimento da diferença que gera a oportunidade da empatia, da abertura à escuta sem julgamentos. Podemos, assim, ler melhor as crianças e entender sua necessidade.

A especialista também discorreu com maestria sobre as questões da linguagem. Lembrou que a voz materna é o único elemento de continuidade entre a vida dentro e fora da barriga e como as mães podem fazer uso da sua voz desde os primeiros dias do bebê para acolhê-lo, seja conversando, cantando ou lendo. Fez o grupo pensar ainda sobre o uso que fazemos da linguagem com as crianças, colocando-as muitas vezes a serviço do controle ou mesmo das consignas/orientações – ou seja, em boa parte do tempo, falamos com a criança para interditá-las ou direcioná-las a fazer algo. Por fim, defendeu com amor o papel da poesia nas nossas vidas, e propôs que todos nós pensemos em introduzir a poesia tão logo quanto possível na vida das crianças.

Durante toda sua apresentação, María Emilia marcou alguns aspectos políticos:

  1. A inclusão de mães e pais como destinatários da instituição de educação infantil, o que significa garantir o acompanhamento de uma fase de transição fundamental para o desenvolvimento psíquico dos bebês.
  2. Garantir condições para que educadores possam lidar com as demandas individuais dos bebês. Uma sala de 20 ou 30 crianças pequenas com apenas um educador não é um ambiente propício para isso e possibilita que esses educadores cheguem ao “lugar selvagem”.
  3. Formação docente: é imprescindível garantir ferramentas para que os educadores possam lidar com questões tão delicadas como a proteção e cuidados que garantem o desenvolvimento psíquico através de uma linguagem poética, criadora de sentido para as experiências vivenciadas nessa fase da vida.

Especialista em Educação Inicial e Leitura e Literatura Infantil, María Emilia, além de dirigir a creche acima citada, coordena programas de formação docente e programas de leitura e educação artística para bebês e crianças pequenas, e atua como consultora em diversos países e para o Cerlalc (Centro Regional para o Fomento do na América Latina e no Caribe).

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