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08/03/2021

Estudo sobre oportunidades educacionais destaca necessidade de políticas próprias para populações tradicionais

Estudo realizado pela Comunidade Educativa CEDAC aponta que a falta de políticas públicas específicas para populações quilombolas, indígenas e de áreas rurais e fronteiriças compromete o seu acesso às oportunidades educacionais nos territórios onde vivem.

A pesquisa, que contou com a parceria da Porticus e outras organizações, baseou-se em análises de dados e entrevistas em 10 municípios das regiões Norte e Nordeste com grande concentração desses perfis populacionais.

Partindo do conceito de oportunidades educacionais expresso no Ioeb – Índice de Oportunidades da Educação Brasileira (Ioeb) – que está sob a gestão da CE CEDAC desde 2018, o trabalho foi realizado em duas etapas, no período entre janeiro e dezembro de 2020, com a intenção de construir conhecimentos sobre as oportunidades de educação em diferentes territórios brasileiros.

O Ioeb indica as oportunidades educacionais oferecidas para todas crianças e jovens em um município ou estado. Inclui tanto informações referentes à qualidade da oferta para alunos que frequentam as redes públicas e privadas como aquelas referentes a crianças e jovens que não frequentam a escola. O índice é formado a partir da relação de um conjunto de fatores e seus respectivos pesos. Esses fatores estão divididos em dois grupos: indicadores de insumos educacionais, ou seja, fatores essenciais que alimentam o segundo grupo, de indicadores de resultados educacionais, sejam eles de atendimento, de aprendizado ou de aproveitamento escolar.

Na primeira etapa do estudo, as pesquisadoras selecionaram os municípios com base em dados secundários (INEP 2018, IBGE e Metas Sociais) e, em seguida, analisaram as séries históricas Ioeb, bem como de seus indicadores de Insumos e Resultados e dados contextuais como número de matrículas e população. Com essas informações, identificaram semelhanças e diferenças entre grupos de municípios dentro e fora destes recortes por estado onde os municípios selecionados se localizam, a fim de responder a duas grandes questões: Como o Ioeb se comporta em grupos de municípios predominantemente indígenas, quilombolas, fronteiriços e rurais? e “Que hipóteses podemos antecipar sobre as oportunidades oferecidas às crianças e jovens em idade escolar em tais localidades?”

A partir desses resultados, das hipóteses antecipadas, bem como de leituras bibliográficas sobre as realidades dos 4 perfis presentes no estudo, na segunda etapa, as pesquisadoras entrevistaram educadores, lideranças comunitárias e gestores dos territórios selecionados, gerando uma análise qualitativa sobre as políticas educacionais e as condições ofertadas para crianças e jovens em idade escolar. As entrevistas tiveram de ser feitas de forma remota em função do contexto da pandemia.

“Foi uma experiência de muita aprendizagem, de aprofundamento sobre o conhecimento do Brasil real, mesmo com as limitações que tivemos em função da pandemia”, relata Renata Grinfeld, coordenadora do estudo. “Escutar essas pessoas que, generosamente, participaram do estudo (indígenas, quilombolas, rurais e fronteiriços) nos deu uma consciência muito maior sobre a urgência de nos mobilizarmos cada vez mais para priorizar ações que contemplem, além de suas particularidades, a integração e o diálogo dos conhecimentos dos povos tradicionais com os conhecimentos convencionais”, complementa.

O estudo destacou os desafios, mas também os êxitos alcançados em parte das comunidades no acesso às oportunidades educacionais.

“O protagonismo da educação indígena especialmente em Roraima, pela organização dos professores indígenas, traz em sua conjuntura uma educação específica e diferenciada a qual se diferencia dos demais modelos educacionais e traz um histórico de conquistas”, afirmou Marcio Pereira, professor da E.E. Indígena Júlio Pereira, de Uiramutã, Roraima, um dos entrevistados do recorte indígena.

Márcio citou como uma das práticas efetivas na educação em tempos de pandemia: o desenvolvimento do calendário socionatural, que organiza as atividades de acordo com os períodos indicados no mês e partindo das atividades tradicionais da população indígena. O docente explica que articulam-se nesse calendário conhecimentos científicos, convencionais e culturais nas atividades de caráter multidisciplinar.

Um dos entrevistados dos municípios do recorte rural, Joaquim Belo, amapaense da Escola Família Agroextrativista do Carvão, no município de Mazagão, conta que a participação no estudo o ajudou a entender a necessidade de ele e a sua comunidade cobrarem mais do município e do estado a cumprirem suas responsabilidades em relação a uma “educação contextualizada, uma educação que consiga enxergar essa realizada que a gente vive”.

“A reflexão feita a partir da participação desse estudo é a de que as escolas, sejam municipais ou estaduais, estão desconectadas da realidade” afirma. “E quando ela faz isso, provoca o êxodo rural porque não valoriza o próprio meio em que a escola está inserida. 

O estudo também contou com colaboração da Flacso  (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais), na conversa com pesquisadoras especialistas em cada um dos recortes, bem como na indicação de entrevistados nos municípios contemplados.

Abaixo, uma síntese das conclusões sobre as oportunidades em cada recorte populacional estudado:

Indígena

O fato de os municípios encontrarem-se em áreas amazônicas – para além da fronteira do estado do Amazonas – traz questões geográficas importantes que impactam o acesso a oportunidades educacionais. Além disso, a implementação da parte diversificada da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) impõe o desafio da formação de professores indígenas, pois essas áreas contemplam culturas e línguas muito diversas entre si.

Quilombola

A existência de políticas estaduais relacionadas à educação escolar quilombola, bem como parcerias que apoiem iniciativas de valorização da tradição e da cultura quilombola, pode gerar grande impacto nas oportunidades educacionais, uma vez que não foram encontradas recorrências importantes entre os dois estados analisados no recorte quilombola.

Fronteira

Não foram identificadas políticas específicas que amparem os municípios fronteiriços a receber matrículas estrangeiras de forma planejada. Oportunidades educacionais são impactadas pelo contexto da fronteira e do país vizinho – ou seja, variam em função das diferenças entre acordos bilaterais de imigração e, sobretudo, do fluxo migratório que se estabelece em diferentes momentos socioeconômicos. O desempenho dos municípios do recorte fronteiriço é, em geral, menor do que dos demais, porém não é possível identificar um padrão comum para os municípios fronteiriços dos diferentes estados que foram analisados no estudo.

Rurais

O fato de os municípios encontrarem-se em áreas rurais traz questões geográficas importantes que impactam o acesso a oportunidades educacionais em seus variados contextos (florestais, ribeirinhos, da mata, entre outros). Também é possível que as diferentes políticas públicas estaduais e municipais destinadas às particularidades da educação do campo, bem como parcerias estabelecidas (com universidades e ONGs, por exemplo) – ou a falta delas – tenham grande impacto nas oportunidades, pois não há um padrão entre os municípios pesquisados nos diferentes estados.

Leia o estudo on-line Baixe o PDF do estudo

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