Recebemos estudantes da rede pública e privada, na sede da Comunidade Educativa CEDAC, com o objetivo de conversar e colher sugestões sobre a Base Nacional Comum Curricular. Alice Ribeiro , do Movimento pela Base Nacional Comum Curricular,  também esteve presente e contextualizou o processo de elaboração do documento, tirando as dúvidas dos estudantes sobre a ideia de um currículo comum para o Brasil.

Os jovens mostraram-se preocupados com os conteúdos ensinados, pois, em sua opinião, a maioria deles está a serviço do vestibular. Para Yuri, estudante da Escola da Vila, o modelo que temos hoje é perverso, pois ao mesmo tempo que não dá oportunidade para que todos possam seguir para o curso superior, existe uma ideia difundida de que só se tem oportunidade de trabalho com o curso superior.

Alice comentou que hoje, por uma inversão muito ruim, as diretrizes do currículo na prática são as avaliações externas e os livros didáticos. “É necessário gerar uma espinha dorsal que organize todo o sistema educacional e a Base possa oferecer esse caminho.”

Todos os estudantes concordam que o modelo que temos hoje, em que os alunos ficam sentados em fileiras recebendo o conteúdo do professor, é ultrapassado e precisa ser transformado. Eles querem uma escola que extrapole os muros, que se conecte com a cidade, em que não seja o professor o único a ter a palavra, que trabalhe não só com a mente, mas também com o corpo.

“Faltam outros meios de se ensinar na escola. O foco é sempre só vestibular. Tem de ter algo na Base que diz respeito ao conhecimento que não é pedido no vestibular. Também acho que tem de ter algo sobre identidade de gênero. Também tem de considerar a subjetividade do indivíduo. E a cultura, como será considerada na Base? É preciso trabalhar com o corpo, com a cidade, não só com a cabeça, não só a formação intelectual.” (Ian, estudante da Escola da Vila)

“Tem de romper a barreira instituição/sociedade. O que aprendemos na escola deve ser aplicado. Acho que a ideia de sala de aula é muito ultrapassada, tem de acabar com essa ideia de sentar no banco para aprender, de educação bancária.” (Luara, estudante da Escola da Vila)

Duas estudantes de escolas estaduais de São Paulo contaram, de forma emocionada, sua experiência no período de ocupação das escolas no ano passado. Para elas, aquele foi o momento em que houve mais troca e aprendizado, em que barreiras foram rompidas e em que aconteceram muitas transformações no seu modo de pensar e agir.

“Passei o ano letivo todo olhando a nuca do meu amigo da frente, conhecia a voz dele, mas nunca tinha olhado no olho. Precisou da ocupação para eu olhar nos olhos dele. Esse modelo da sala de aula precisa mudar.” (Nicole, estudante da Escola Estadual José Lins do Rego)

Tainá, estudante da Escola Estadual Dona Ana Rosa de Araújo, ressaltou a importância do contato humano e do quanto isso é potente, pois cria empatia, aproxima os indivíduos. Ela contou que na ocupação, ao conviver de perto com amigos homossexuais, compreendeu que tinham problemas para usar o banheiro da escola, pois não se identificavam com o banheiro masculino e eram proibidos de frequentar o feminino. Em conversa, decidiram, então, retirar as placas dos banheiros, para que tudo virasse unissex.

“No começo da ocupação os meninos ficavam no portão e as meninas na cozinha ou limpando e organizando o espaço, durante a ocupação isso mudou. Aprendemos muito sobre machismo, sobre política, sobre o que pensamos só porque a sociedade nos impõe”, ressaltou Tainá, que hoje critica o modelo patriarcal da sua casa, em que ela tem de lavar a louça, e seu irmão, por ser menino, não.

Mais do que discutir sobre a Base, discutimos sobre o papel político da escola. A voz dos estudantes indica que além de pensar em conteúdos, a Base deve orientar uma mudança no modelo de funcionamento da sala de aula para renovar. A forma como os conteúdos são transmitidos é tão importante quanto o tipo de conteúdo a ser ensinado, a forma também ensina, e muito!